Sunday, April 02, 2006

Andar de autocarro é que está a dar…


Desde que o metro começou a funcionar que a minha vida mudou. Muito mais cómodo, mais rápido, passa com mais frequência, sabemos quantos minutos vai demorar a passar e não apanha trânsito o que só por si chegava! Como me sentia feliz ao ouvir a doce voz da senhora, que não sabe que o plural de bus é buses, a informar-nos: Estimado cliente, o próximo veículo terá como destino o Estádio do Dragão e chegará dentro de breves momentos ao cais… 1! (Gostava tanto do suspense que ela fazia antes do número) Agora mudaram a lengalenga… Não gosto.
Já há uns tempos que venho a notar que os portuenses descobriram o metro, como se do telemóvel se tratasse. O que dantes ficava tipo lata de sardinha quando havia jogos no Dragão, agora fica em conserva em todas as horas. Em contrapartida os autocarros que fazem mais ou menos os mesmos trajectos do metro andam às moscas! E depois claro que fecham certas linhas. Ora não acho bem! Por isso quero aqui apelar-vos: Usem os autocarros! Eles é que são nossos amigos! Já cá andavam antes dessa modernice que é o metro! Agora que apelei ao vosso coração fico com a certeza que viajarei muito mais à larga nessa modernice, que nem se digna a entrar no trânsito do Porto, que bergonha!

Posto isto, quero contar-vos um episódio da minha vida digno de uma novela da TVI.
Precisei de ir ao Candal no outro dia e como o metro não vai por esses lados lá me dirigi à Praça da Galiza para apanhar o 93. Para não variar este estava tão apinhado que mal consegui chegar até ao Destak pendurado numa bolsa atrás do primeiro banco de passageiros. Fiquei aí de pé, mesmo atrás do condutor. Aqui começa a minha história.
A paragem seguinte, é ali à beira do posto de gasolina ao lado da Junta de Massarelos. Como de costume, o ar renova-se e enquanto vários passageiros vão à sua vida, montes deles (muitos mais do que os que saem) juntam-se à tripulação do 93. Nisto, estava eu a deixar passar o people para a retaguarda, quando uma voz se eleva na multidão.
Passageiro: Já lhe mostrei o passe! Não o torno a fazer!
Condutor: Estou-lhe a dizer que não o vi por isso preciso que mo mostre outra vez.
Passageiro: Não lhe bou mostrar coisa nenhuma! Já o mostrei uma bez como toda a gente se não biu não tenho culpa!
Condutor: Mostre-me o passe se faxabor!
Passageiro: ‘Tá desconfiado é? Os outros só mostraram uma vez! Porque é que eu tenho de o mostrar duas?
Condutor: Já lhe disse que não vi! Mostre-me o passe! Não saio daqui enquanto não vir o seu passe.
Passageiro: Era só o que me faltava...
Condutor: Não arranco o carro enquanto não mo mostrar.

Ponto de situação: O motor do autocarro estava desligado. Entretanto levantara-se um burburinho entre os restantes passageiros (e olhem que eram muitos). “Ai que nunca mais saímos daqui!”, “Oh Sr. motorista deixe lá o passe do homem e leve-nos mas é para casa que temos mais que fazer à vida!” “Oh Sr. mostre lá o passe pa gente ir embora”. O condutor começa a deitar fumo pelas orelhas (juro que me pareceu pelo espelho retrovisor). O Sr. do passe começava a andar de um lado para outro meio orgulhoso, meio aflito, meio sem saber muito bem o que estava a fazer. Eu… caso se estejam a perguntar…estava precisamente entre o Sr. do passe e o condutor, sem saber se me irritava porque ia chegar atrasada, se entrava em pânico porque estava a ver que ia haver porrada, se me ria daquela palhaçada toda. Por esta altura reparo num jovem de olho azul ao lado do condutor que não conseguira passar da porta por causa da confusão e que do alto da sua sabedoria diz:

Jovem de olhos azuis: A autoridade aqui é o motorista. Tem de lhe mostrar o passe as vezes que ele quiser. Neste caso não tem razão...
Sr. do passe: Não mostro já disse! E vamos lá embora masé!
Sra calma atrás de mim: Oh senhor, a gente compreende mas tenha um bocadinho de consideração por nós que ele não arranca enquanto não lhe mostrar...
Sr. do passe: Olhe eu peço desculpa mas não é nada contra a Sra., a sério.
Outra passageira mas cos nervos em franja: Ah masé connosco é!!!! Que nós não saímos daqui por sua causa!!
Sr. do passe: Olhe eu tenho consideração por vocês mas por ele (a apontar para o motorista) não!!
Sra calma: Está bem. Então mostre lá o passe...

Finalmente o homem chega-se à beira do motorista e saca da carteira. Eu penso cá para mim que agora é que vão ser elas porque o senhor de certeza que não tem passe, devia ter-lhe mostrado o cartão de utente ou do BES, como é costume.
Não é que o raio do homem tem a porra do passe em dia e em condições!!! Não sei se fique extremamente desapontada ou aliviada... O condutor arranca finalmente a carripana e lá vamos nós à nossa vida. Mas para quem pensa que a história acabou desengane-se. Numa demonstração de orgulho da parvónia os dois indivíduos continuam a murmurar insultos, pequenas queixinhas, vá.

Sr. do passe: Isto é masé uma falta de respeito...
Condutor: Pensa que é quem?
Sr. do passe: Mas eu lá sou diferente dos outros? Mas ‘tou mal vestido, é?
Condutor: Parece que se acha diferente dos outros. Lamento mas à muita gente que anda aqui de graça...
Sr. do passe: Deve pensar que é muito Homem! Parece que tem o rei na barriga!
Condutor: Parece-me é que quer ir a pé!
Sr. do passe: Ai ir a pé! Experimente!
Condutor: Não me custa nada parar aqui o autocarro e pô-lo lá fora!
Sr. do passe: Veja lá se é capaz.
Condutor: Olhe que chamo a polícia e ponho-o lá fora! Não me custa nada!
Sr. do passe: Quer festa é... só pode!
Condutor: Olha, deve pensar que ‘tá a falar com a família dele!
O Sr. do passe tem um ataque esquizofrénico, passa-se dos carretos corre po lado do motorista, espeta-lhe o dedo na cara e “cospe-lhe” com ar mafioso: Você não fale da minha família ‘tá a ouvir! Você não sabe nada da minha família!
Condutor: NEM SE ATREVA A TOCAR-ME! QUE NEM LHE PASSE PELA CABEÇA!
Nisto, o jovem de olhos azuis acorda pá vida e gentilmente tira o homem da cara do motorista e uma senhora tenta acalmá-lo, a dizer que compreende a sua posição. Devo salientar que estava um silêncio brutal no interior do veículo. Mas foi no momento seguinte que temi pela minha vida. Como num show de testosterona os senhores continuam o chorrilho de disparates e insultos e o condutor encosta à berma uns metros antes da Blockbuster e pára o autocarro! Tá o caldo entornado de vez!
Condutor: Ora saia do autocarro, faxabor!
Sr. do passe: Ponha-me lá fora para ver se é Homem!
E pronto! O condutor desliga o motor. Afasta aquela barra preta das moedas do lado esquerdo, levanta-se e planta-se de braços cruzados à Rambo virado para nós. Era grande! E robusto com ar de quem fez a tropa toda. Para não variar a única coisa entre os dois era...eu! O meu sentido prático começou logo a pensar qual seria o hospital mais próximo...
Condutor: Ora venha-me bater!
E foi nesta altura em que uma senhora lá do fundo se põe entre os dois (ao meu lado, portanto) e virada po motorista diz em voz baixa: Agora está a perder a razão. Todas as pessoas que aqui estão sabem que o Sr. não teve culpa nenhuma nem fez nada de mal mas agora perdeu a razão. Por favor tenha calma.
Senti uma grande admiração por aquela senhora com ar cansado de quem trabalhou o dia todo, que teve sangre frio no descalabro duma situação tresloucada em que todos ficaram colados às cadeiras. Eu devo ter deixado de respirar. À minha esquerda o Sr. do passe espumava de raiva enquanto lhe seguravam o casaco para o imobilizar e à minha direita tinha o Rambo com ar de poucos amigos mais o jovem de olhos azuis colado à porta da frente. No bus, o silêncio imperava.
Finalmente o condutor pede desculpa, senta-se e leva o autocarro até à paragem seguinte. Silêncio descumunal.
O abrir das portas traz uns caloiros de química e duas senhoras que conversavam alegremente e num tom de voz próprio de quem vai entrar num autocarro apinhado de gente. “A Alcina nem faz ideia do que a espera ela que não ponha a pau que...” – o autocarro inteiro ouviu. Ao que as senhoras olharam em volta muito surpresas e baixaram o tom de voz embaraçadas “Carago! ‘Távamos mesmo a falar alto.” Com este refresco alguém se cola a mim. Olho para cima e vejo o jovem de olhos azuis que olhava o Sr do passe (que ainda resmungava baixinho, que a testosterona pelos vistos é coisa que nunca mais tem fim) num ar receoso. Notando que eu o olhava fitou-me e partimo-nos os dois a rir à gargalhadas feitos tolinhos. O que vale é que depois de tudo, ninguém notou.

A minha conclusão resume-se em duas frases:
Mas para que é que eu ando de metro enquanto posso assistir a estes espectáculos pela módica quantia de um bilhete de autocarro!
E confirma-se a minha teoria... os adultos, parecem putos!!

2 comments:

Anonymous said...

LOOOOOOOOOOOOOOOOOOOL é a loucura! eu podia prolongar este looool por mts + megabits, mas era xato.... olha k tu p dares nomes a personagens é 1 show!!!

e bibó condutor e o sr do passe, k t animaram o dia! k parvoeira....
mas olha k o metro tem a sua piada... até s encntram 1s resquícios d simpatia e tal....

*mt sono, pca inspiração p mais*
akele abraço @-;--

Anonymous said...

Oi Tatchi! :)
Finalmente ganhei coragem pa te escrever a tal meia dúzia de palavras que te quero dizer desde que li o teu primeiro e brilhante texto..
De génio!! começo por dizer!
Tenho imenso orgulho em dizer que tenho uma amiga que faz magia com as palavras..:) Não desistas NUNCA do teu sonho porque tens tudo aí dentro, guardado no teu coração, na tua cabeça, acredito em ti, acho que acreditamos todos...
Uma bjoka cheia de força pa ti e muita sorte!

P.s. Só quero que me mandem um grande bjinho no dia dos meus anos, ok?:P :) brigada por tudo!!